Breves considerações sobre execução cível contra empresa em recuperação judicial

A empresa recuperanda defende que a data “marco” para inclusão dos créditos é a data do fato gerador que o constituiu, os credores entendem que a data que define a sujeição do crédito à recuperação judicial é a do trânsito em julgado da sentença que reconhece o crédito.

Há uma grande discussão em torno de qual é a data utilizada como critério para definir se determinado crédito será incluído ou não na recuperação judicial.

Enquanto a empresa recuperanda defende que a data “marco” para inclusão dos créditos é a data do fato gerador que o constituiu, os credores entendem que a data que define a sujeição do crédito à recuperação judicial é a do trânsito em julgado da sentença que reconhece o crédito, quando se tornaria indiscutível a dívida da empresa recuperanda para com o credor.

A divergência entre estas datas fez com que o tema fosse levado à 2ª seção do Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos especiais repetitivos, tema 1.051, com relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

O tema afetado é justamente a Interpretação do artigo 49, caput, da lei 11.101/05, de modo a definir se a existência do crédito é determinada pela data de seu fato gerador ou pelo trânsito em julgado da sentença que o reconhece.

O caput do artigo 49 da lei 11.101/05, dispõe o seguinte:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

O ministro relator ponderou ser de extrema importância debruçar-se sobre o tema a fim de “identificar o que deve ser considerado como crédito existente na data do pedido, ainda que não vencido”.

Como se sabe, nos termos do caput do artigo 59 da lei 11.101/05, o pedido de recuperação judicial faz com que todos as dívidas da empresa sejam novadas:

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta lei.

Para a empresa recuperanda é vantajoso que a data da existência do crédito seja a do fato gerador, pois, se for de data anterior, estará sujeito à regra da novação de todas as dívidas consequência do pedido de recuperação judicial (caput do artigo 59 da lei 11.101/05), mesmo sendo constituído judicialmente após anos.

Por sua vez, para o credor, a vantagem seria o seu crédito ter como marco a data do trânsito em julgado da sentença reconhecendo a obrigação da empresa recuperanda quanto ao pagamento da dívida, possibilitando o recebimento pelo credor sem ter que se submeter à novação – que pode contemplar deságio e pagamento parcelado a longo prazo- decorrente do pedido de recuperação prevista no caput do artigo 49 da lei 11.101/05.

Como se pode perceber, além da controvérsia submetida ao Poder Judiciário quanto à necessidade de ‘definir o momento em que o crédito decorrente de fato ocorrido antes do pedido de recuperação judicial deve ser considerado existente para o fim de submissão a seus efeitos, a data do fato gerador ou do trânsito em julgado da sentença que o reconhece’, existe a questão socioeconômica, pois se a existência do crédito é determinada pela data de seu fato gerador, favorece-se a superação da crise econômico-financeira vivenciada pela empresa que poderá parcelar por longos anos, além de aplicar deságio sobre o valor devido, reduzindo-o significativamente.

Inobstante o posicionamento trazido pelos credores que, após sujeitarem-se ao período de duração do processo de cobrança da dívida, querem obter a satisfação imediata do seu crédito, a tese firmada pela 2ª seção do Superior Tribunal de Justiça no tema 1051, foi de que “Para o fim de submissão aos efeitos da recuperação judicial, considera-se que a existência do crédito é determinada pela data em que ocorreu o seu fato gerador”, sendo certo que todo o Judiciário deverá seguir a posição definida quando do julgamento do citado tema, por força do disposto no inciso III, do artigo artigo 927 do Código de Processo Civil.

Interpretação contrária faria com a empresa recuperanda fosse obrigada a pagar o crédito integral da demanda, sem os benefícios previstos no plano da Recuperação Judicial, seguindo as regras do artigo 523 do Código de Processo Civil.

Ou seja, no prazo de 15 dias, sob as penalidades processuais, que implicam, sobretudo, em multa e honorários advocatícios, totalizando um acréscimo de vinte por cento sobre o total do débito, a empresa recuperanda teria que pagar o crédito constituído, mesmo com o fato gerador ocorrendo antes do início do procedimento recuperacional, gerando implicações negativas diretas no seu processo de soerguimento.

A implicação processual da tese firmada é a não iniciação do procedimento do Cumprimento de Sentença após a constituição do crédito, devendo ser emitida a competente certidão de crédito para inclusão nos autos do procedimento de Recuperação Judicial.

Apesar de a hipótese em comento parecer muito ruim para o credor, a inclusão do seu crédito na Recuperação Judicial permite a preservação da empresa, a manutenção dos empregos e, por fim, protegem os interesses dos próprios credores (a teor do disposto no artigo 47 da lei 11.101/05), mesmo porque, havendo a quebra da empresa, não há qualquer perspectiva de recebimento de crédito.

Por: Lucas Delgado Conceição

Advogado associado ao escritório GBSA – Gonçalves e Bruno Sociedade de Advogados. Graduado pela Universidade São Judas Tadeu. Pós-graduando em Direito Processual Civil pela PUC/SP.

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