TRAMITA NO SENADO FEDERAL PROJETO DE LEI QUE TIPIFICA O CRIME DE CORRUPÇÃO PRIVADA

 

Miguel Angelo Salles Manente

Graduado pela Faculdade de Direito de Guarulhos. Advogado com ampla atuação nas áreas do Direito Civil, Direito do Trabalho e Compliance.

 

 

Luis Felipe Pardi

Graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Advogado com atuação nas áreas do Direito Civil e Direito Regulatório.

 

 

 

 Em meio à intensa sensação de impunidade que assola a sociedade brasileira frente os inúmeros e perenes escândalos de corrupção perpetrados por detentores do poder político e/ou econômico, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei nº 455, de 2016, que pretende alterar “o Código Penal para prever o crime de corrupção privada”.

 Em síntese, em caso de aprovação, criar-se-á o art. 196-A no Código Penal, que tipificará, como o crime de Corrupção Privada, as condutas de “Exigir, solicitar, aceitar ou receber vantagem indevida, o diretor, o administrador, o membro de conselho ou de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto, o representante ou o empregado da empresa ou instituição privada, para favorecer a si ou a terceiros, direta ou indiretamente, ou aceitar promessa de vantagem indevida, a fim de realizar ou omitir ato inerente às suas atribuições”.

 A pena proposta para o novo crime é de reclusão, de 01 (um) a 04 (quatro) anos, e multa, sobre a qual também incorrerá, em caso de aprovação “quem oferece, promete, entrega ou paga, direta ou indiretamente, a vantagem indevida”.

 O Projeto de Lei foi de iniciativa da Comissão Parlamentar de Inquérito do Futebol 2015, finalizada em 2016, cujo relator era o então Senador Romero Jucá (PMDB/RR). Pretendia-se, na oportunidade, investigar, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, “a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo FIFA Brasil 2014 (COL), em especial quanto a possíveis irregularidades em contratos feitos para a realização de partidas da seleção brasileira e de campeonatos organizados pela CBF, assim como para a realização da Copa das Confederações FIFA 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2014”.

 Inicialmente, o condão do Projeto de Lei era coibir o pagamento de propinas para cessão de direitos de transmissão de jogos de futebol que foram relatados durante o funcionamento da CPI.

 Todavia, atualmente, o Projeto de Lei possui um intuito mais amplo e definitivamente necessário: pretende reforçar a atuação das autoridades policiais e judiciárias perante o empresariado, a fim de que este faça vigorar, de fato, em suas ações, de maneira efetiva, a aplicação e concretização de boas práticas empresariais, Códigos de Conduta e Grupos Especializados de Compliance.

 Trata-se, sem dúvidas, de um grande avanço de nosso Legislador, porquanto as únicas condutas atualmente consideradas crime de corrupção abarcam, necessariamente, a figura de um funcionário público ou alguém a ele equiparado, deixando escapar da previsão legal o empresariado e/ou pessoas a ele relacionadas que praticam condutas imorais, antiéticas e anticoncorrenciais na esfera privada para satisfazer seus interesses pessoais ou de outrem.

 Confiram-se, abaixo, os Crimes de Corrupção Passiva e Corrupção Ativa, respectivamente. Reparem como a linguagem utilizada – destacada, com nossos grifos – já remete ao funcionalismo público:

 “Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

 Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

  • 1º – A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
  • 2º – Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.”

 

 “Art. 333 – Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:

 Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

 Parágrafo único – A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.”

 Diante do que acaba de ser exposto, imperioso mencionar que o caput do art. 327 do Código Penal define, como funcionário público, todo aquele que ”embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública”.

 Ademais, segundo o §1º do artigo acima, equipara-se a funcionário público todo aquele que “exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública”.

 Portanto, a Polícia Judiciária, Ministério Público e Poder Judiciário, que antes cuidavam apenas de combater as infrações penais que causassem danos à Administração Pública ante a conduta que abarcava necessariamente um funcionário público, em caso de aprovação, passarão a levar efeito a persecução penal similar para a esfera privada.

 Finalmente o Brasil poderá seguir o exemplo de outros países que já preveem como crime a Corrupção Privada, cujo caso emblemático, na esfera futebolística, possibilitou, nos Estados Unidos e Suíça, a persecução penal do ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), José Maria Marin.

 Gonçalves e Bruno Sociedade de Advogados – GBSA continuará acompanhando a tramitação do Projeto de Lei nº 455, de 2016, para atualizar seus seguidores, bem como estima e torce por sua aprovação nas 02 (duas) casas do Congresso Nacional.

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