O controle prévio do TCU sobre procedimentos de desestatização

O Tribunal de Contas da União tem atuado de forma irregular ao realizar o controle prévio dos procedimentos de desestatização

O direito brasileiro, historicamente, optou pelo fortalecimento dos órgãos de controle da administração pública no geral. O Tribunal de Contas da União (TCU), em especial, a partir da Constituição de 1988 e por meio de leis posteriores, vem aumentando seu escopo de controle. Em que pese a importância do controle exercido sobre os atos da administração pública, é certo que este deve conhecer certos limites, a fim de possibilitar a adequada atuação dos agentes.

Nesse sentido, chama a atenção a atuação do TCU, o qual vem realizando o controle prévio de processos de desestatização. Toma-se como base, sobretudo, o artigo 18, VIII, da Lei 9.491/97. Mais recentemente, contudo, foi editada a Instrução Normativa 81, ampliando as possibilidades de controle prévio do TCU. Tal fenômeno suscita diversas questões, da insegurança jurídica ao engessamento do agente público, e merece especial atenção quando analisamos a atuação das agências reguladoras no Brasil.

Assim, com vistas ao regular desenvolvimento da atividade reguladora no país, é preciso olhar com cautela para a atuação do TCU enquanto órgão de controle prévio da administração pública, sob o risco de criarmos uma cultura jurídica contrária à legislação aplicável e à própria Constituição. Num cenário em que muitas das decisões tomadas são, no mérito, elogiáveis, torna-se politicamente complexo o combate a essa postura do Tribunal de Contas da União, mas é preciso estabelecer um limite ao controle do TCU.

O tema suscita forte debate. De toda forma, há uma predisposição do agente administrador ou regulador em acatar as proposições do TCU, tendo em vista uma série de elementos, como o receio de sofrer algum tipo de responsabilização e o ônus político que muitas vezes acompanha a recusa em atender as recomendações do órgão controlador.

Exemplo disso é a recente recomendação do TCU no âmbito do certame do leilão do 5G, promovido pela ANATEL. Foi recomendado à agência reguladora “que incluam compromissos no edital do leilão do 5G que estabeleçam a obrigação da conectividade das escolas públicas de educação básica, com a qualidade e velocidade necessárias para o uso pedagógico das TIC nas atividades educacionais regulamentadas pela Política de Inovação Educação Conectada”.

Ora, é difícil imaginar como alguém possa ser contra a promoção de internet de qualidade nas escolas públicas de educação básica. Não se trata de uma debate sobre o mérito da recomendação, mas sobre a conveniência do estabelecimento de tal medida. São diversas as obrigações do administrador público e das agências regulatórias na promoção de políticas públicas, de forma que é preciso, a todo tempo, escolher qual a prioridade de investimento. É aí que entra a discricionariedade do agente público, que é minada pelo controle prévio do TCU ao estabelecer verdadeiras políticas públicas.

A tendência, ao longo do tempo, é que ocorra uma verdadeira transferência de poder, transformando os órgãos reguladores em meros espectadores, engessando a sua atuação e ampliando o poder de controle do TCU. Existem argumentos contrários, aplaudindo a atuação do Tribunal de Contas da União sob a justificativa de que ele estaria corrigindo falhas técnicas na atividade reguladora, evitando a tomada de decisões equivocadas. Sob esta ótica, o TCU estaria legitimado a tomar decisões sobre todo e qualquer ato de um agente estatal, uma vez que o órgão seria pautado por uma visão técnica e neutra.

A Constituição Federal, no entanto, não prevê este tipo de atuação dentre as prerrogativas do TCU. Nossa carta magna confere ao Tribunal de Contas da União a possibilidade de controle a posteriori, inexistindo a referência ao controle prévio.

Por: Gabriel Mariotto

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