Dispensa por justa causa: situações em que é cabível e direitos do empregado

Figura nebulosa na legislação trabalhista brasileira, a justa causa e suas principais modalidades merecem especial atenção, assim como os direitos do trabalhador despedido.

Por Gabriel Mariotto

A dispensa de um empregado por justa causa é uma situação relativamente comum. Contudo, muitos patrões não conhecem bem as condições previstas em lei para que o trabalhador possa ser mandado embora dessa forma.

Do mesmo jeito, muitos empregados não sabem os benefícios a que têm direito, uma vez que são despedidos justificadamente. Assim, parece relevante explorar as atitudes do empregado que, segundo a lei, dão ao patrão o direito de dispensá-lo sem pagar os encargos trabalhistas habituais.

Vale ressaltar o nome técnico dado à demissão no mundo do direito. Enquanto o termo “demissão” se refere à iniciativa do empregado de pôr um fim à relação de trabalho, nos referimos à “dispensa” ou “despedimento” quanto é o empregador quem desfaz o contrato.

O direito brasileiro reconhece também a justa causa do empregador. Trata-se da situação na qual o patrão se porta de tal forma a comprometer o desempenho do empregado, o que lhe dá o direito de se demitir sem as penalidades habituais.

Este artigo, no entanto, visa esclarecer apenas as situações que dão ao patrão justa causa para a dispensa do empregado. Serão explorados também quais os direitos do trabalhador dispensado nessa situação.

HIPÓTESES DA JUSTA CAUSA

A análise do tema parte da leitura do artigo 482 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que indica as situações nas quais é observada a justa causa para dispensa do empregado. É importante enumerar e explicar as situações previstas nos itens do artigo mencionado:

a) “ato de improbidade”: ato cometido pelo empregado com o objetivo de atingir o patrimônio do patrão ou alguma outra pessoa, como por exemplo o desvio de dinheiro para o próprio bolso;

b) “incontinência de conduta ou mau procedimento”: comportamento contrário à moral da sociedade, como por exemplo algum tipo de assédio sexual; 

c) “negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço”: situação na qual o trabalhador já negocia seu próximo emprego sem que o patrão saiba;

d) “condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena”: condenação do trabalhador por algum crime, não necessariamente relacionado ao trabalho, com destaque para a importância do trânsito em julgado da ação;

e) “desídia no desempenho das respectivas funções”: negligência, imperícia ou imprudência do empregado no desempenho de suas funções, ou seja, descaso com as tarefas que recebe;

f) “embriaguez habitual ou em serviço”: a embriaguez eventual do empregado em serviço é reconhecida como justa causa para a sua dispensa, enquanto a embriaguez habitual é compreendida atualmente, tanto pela Organização Mundial de Saúde tanto pela jurisprudência nacional como uma doença, sendo que o mais aconselhável é apenas a suspensão do contrato de trabalho e o encaminhamento do empregado ao INSS;

g) “violação de segredo da empresa”: aplica-se aos empregados que tem o dever de não revelar dados confidenciais aos quais tem acesso no trabalho;

h) “ato de indisciplina ou de insubordinação”: descumprimento de ordens diretas e pessoais do patrão;

i) “abandono de emprego”: situação na qual o empregado, por vontade própria, além de não se apresentar para trabalhar por um longo período, não demonstra a intenção de retornar;

j) “ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem”: situação muito parecida com a descrição dos crimes de injúria, calúnia e difamação, atos que realmente atingem a honra e autoestima de alguém, mas obrigatoriamente no ambiente de trabalho, englobando também eventuais agressões físicas; 

k) “ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem”: situação idêntica ao item anterior, mas na qual as ofensas praticadas atingem os superiores do trabalhador;

l) “prática constante de jogos de azar”: situação específica e de fácil compreensão;

m) “perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado”: situação na qual o empregado, por vontade própria, faz algo que lhe impeça de dar continuidade ao seu trabalho por questões legais, como a perda da habilitação no caso de motoristas;

n) “prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional”: o último item da lista e um dos mais discutidos, foi incluído na legislação trabalhista durante o período da ditadura militar, reflexo da preocupação do governo com possíveis atentados à segurança nacional, sem a necessidade de conexão alguma com o ambiente de trabalho, provocando questionamentos também possível ofensa ao princípio constitucional do amplo acesso à justiça.

FUNDAMENTOS

Importante notar que o despedimento do empregado por justa causa, além de restrito às situações previstas no art. 482 da CLT, deve obedecer a alguns fundamentos adotados pela doutrina existente sobre o tema. Trato em especial aqui do entendimento de Amauri Mascaro Nascimento sobre o assunto.

Em primeiro lugar, é importante que a dispensa por justa causa ocorra logo após o empregador tomar conhecimento da falta cometida pelo empregado. De outra forma, ficaria implícito que o patrão não dá grande importância ao descuido cometido e que, portanto, o despedimento não seria necessário.

Isso se justifica pela própria natureza da justa causa do empregado. Trata-se de uma norma que busca a facilitar o fim do contrato de trabalho quando a sua continuidade se torna muito difícil ou impossível por conta de alguma ação ou omissão do funcionário.

Além de atual, a falta cometida deve ser considerada grave. Uma falta leve, mesmo que possa ser enquadrada nas figuras do artigo 482 da CLT, não deve ser considerada tecnicamente como justa causa. Isso porque é preciso que a confiança característica do contrato de trabalho tenha sido rompida.

Nos casos em que a gravidade da falta for considerada leve, deve o empregador aplicar uma punição mais branda, proporcional ao erro cometido pelo trabalhador, reservando a dispensa por justa causa aos casos de descuidos graves.

Por fim, deve haver uma relação de causa e efeito direta entre o ato cometido pelo trabalhador e o despedimento por justa causa. Ou seja, a justa causa deve ser o motivo específico do despedimento do trabalhador.

Em certos países, como Portugal, é obrigatória a justificativa expressa da dispensa por justa causa. No Brasil, não existe essa exigência. No entanto, caso o trabalhador entre na justiça do trabalho por conta de sua dispensa, aí sim deverá o empregador justificar o despedimento por justa causa.

DIREITOS DO EMPREGADO

Na dispensa por justa causa o empregado receberá somente o saldo de salário, os salários atrasados e as férias vencidas acrescidas de um terço de seu valor.

O saldo do salário diz respeito ao salário devido pelo patrão pelo último mês parcialmente trabalhado pelo empregado. Ou seja, equivale a um percentual do valor do salário mensal do trabalhador, igual ao percentual de dias trabalhados no mês. Matematicamente, divide-se o valor do salário por 30 (trinta) e multiplica-se o resultado pelo número de dias trabalhados até a dispensa.

Já as férias vencidas são aquelas que, após conquistadas pelo trabalhador, não foram usufruídas dentro do período de um ano. O trabalhador adquire o direito a férias após um ano de trabalho. No entanto, caso o empregado tenha direito a férias que ainda não venceram, essas não lhe serão devidas após a dispensa por justa causa.

Dessa forma, o empregado perde o direito à indenização (correspondente a 40% do FGTS), ao aviso prévio, ao 13º salário e às férias proporcionais, ao saque do FGTS e ao seguro-desemprego.

O FGTS relacionado ao período trabalhado, no entanto, pode ser sacado após três anos da dispensa, caso não haja novos depósitos, ou após a aposentadoria do trabalhador.

O GBSA está à disposição de seus admiradores, clientes e seguidores para auxiliar em assuntos correlatos às relações de emprego e rescisões de contrato de trabalho.


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