Instituição financeira como depositária e devedora em execuções judiciais: consequências práticas.

Em tal circunstância, o depósito judicial terá o mesmo efeito processual do pagamento? Incidirão juros e correção monetária?

Não é de hoje – aliás, é até usual – que instituições financeiras figuram como autoras, rés, exequentes, executadas ou depositárias em processos judiciais que tramitam nos tribunais brasileiros.

Questão um tanto peculiar, no entanto, é aquela em que uma mesma instituição financeira aparece como (i) executada; e (ii) depositária dos valores devidos.

A primeira discussão prática – e até lógica – é a seguinte: por que raios uma uma instituição financeira devedora tem de depositar valores por ela devidos numa conta bancária – ainda que judicial – que já é administrada por ela?

Para além disso, o depósito judicial realizado pela instituição financeira devedora, nesse caso, terá a característica de (i) garantia e viabilização da discussão judicial sobre os valores devidos; ou (ii) efetivo pagamento? Haverá incidência de correção monetária e juros legais?

Por se tratarem, processualmente, de situações distintas, a instituição financeira deve ser considerada distintamente para cada caso: (i) devedora; e (ii) depositária de valores devidos, ainda que, teoricamente, seja a mesma pessoa em termos práticos.

Dito isto, sigamos com uma situação hipotética: a instituição financeira foi condenada definitivamente a pagar valores ao autor de uma ação judicial. O autor dá início a execução em face da instituição financeira a qual, devidamente intimada, deposita os valores devidos.

Nessa hipótese, a instituição financeira pode se opor ao levantamento dos valores? Afinal, trata-se de depósito garantidor/viabilizador de discussão judicial sobre o valor devido, ou de efetivo pagamento do débito? Incidirão juros e correção monetária?

Entendemos que a oposição da instituição financeira, nesse caso, é manifestação inequívoca de que sua intenção não foi pagar o débito em execução, mas apenas garanti-lo para discuti-lo em juízo, o que, portanto, implicará a incidência de juros legais e correção monetária.

Lado outro, se a instituição financeira não se opor ao levantamento, presente está a intenção de pagar o débito e, portanto, aplicar-se-ão os efeitos legais do pagamento.

É essa a interpretação que decorre da cumulação dos entendimentos dos seguintes julgados de lavra do Superior Tribunal de Justiça com o disposto no art. 394 do Código Civil: (i) REsp 1.348.640/RS; (ii) REsp 1.475.859/RJ; (iii) AgInt no AREsp: 688.982/RS; (iv) RESP 1.790.254.

“Art. 394. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.”

Ou seja, é de se concluir que:

(i) o depósito em garantia do juízo se difere do depósito para pagamento do título judicial; (ii) o depósito para garantia do juízo não constitui cumprimento da obrigação de pagar quantia certa, já que não transfere o valor respectivo para o campo de disponibilidade do credor; (iii) O artigo 394 do Código Civil dispõe que, não cumprida a obrigação no tempo, local e forma devidos, sujeita-se o devedor aos efeitos da mora; (iv) a instituição financeira, na qualidade de depositária dos valores devidos, deverá remunerar o depósito através do pagamento de juros, em decorrência da disponibilidade do uso do dinheiro que terceiros lhe depositaram, bem como correção monetária; (v) o depósito em garantia do juízo implica o não cumprimento da obrigação originária do débito em execução e, portanto; (vi) a instituição financeira, na qualidade de devedora, ao não efetuar o depósito, constitui-se em mora, e deve se responsabilizar por juros e correção monetária aplicáveis.

São essas as principais considerações sobre a situação sui generis de uma instituição financeira figurar, simultaneamente, como depositária e devedora em execuções judiciais.

Por: Luís Felipe Pardi

Advogado associado em Gonçalves e Bruno Sociedade de Advogados – GBSA, inscrito na OAB/SP sob nº 409.236, graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pós-graduado em Direito Processual Penal pela Escola Paulista da Magistratura.

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