O dilema do instituto da pertinência temática no controle concentrado de constitucionalidade

Constituição

A contrariedade da pertinência temática frente à Constituição Federal de 1988 quando do exame constitucional de uma lei ou ato normativo.

A Constituição Federal de 1988 fundamenta o controle concentrado de constitucionalidade, caracterizado como um controle abstrato, de natureza objetiva, o qual busca o exame de constitucionalidade de uma lei ou um ato normativo.

Este controle é obtido através de ações específicas, tal como, a Ação Direta de Inconstitucionalidade, disposta no artigo 102, inciso I, alínea “a” da Constituição.

A Constituição de 1946 fundamentava que somente o Procurador Geral da República possuía legitimidade para representar a propositura de uma ação direta, porém, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 103, ampliou o rol de legitimados para propor ações acerca do controle de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.

Neste sentido, não somente o Procurador Geral da República tem legitimidade para ingressar com ações diretas, mas também Partidos Políticos, Confederações Sindicais e Entidades de Classe nacionais, por exemplo:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:

        I –  o Presidente da República;

        II –  a Mesa do Senado Federal;

        III –  a Mesa da Câmara dos Deputados;

        IV –  a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;

V –  o Governador de Estado ou do Distrito Federal;

        VI –  o Procurador-Geral da República;

        VII –  o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

        VIII – partido político com representação no Congresso Nacional;

        IX –  confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Considerando a expansão de legitimados, o STF viu-se diante da necessidade de criar restrições, a fim de amortecer a quantidade de ações e viabilizar o andamento dos julgamentos e, dentre estas limitações, encontra-se o dever de demonstrar a pertinência temática.

Referido conceito caracteriza-se pela indispensabilidade de que os legitimados provem a ligação do tema da ação com o interesse e objetivo da instituição ou entidade que a propôs. Veja-se:

“A pertinência temática refere-se à necessidade de demonstração, por alguns legitimados, como as entidades de classe e as confederações sindicais, de que o objeto da instituição guarda relação (pertinência) com o pedido da ação direta proposta por referida entidade.”

Cumpre ressaltar que nem todos os legitimados são obrigados a demonstrar a pertinência temática. Aqueles que precisam comprová-la são chamados de legitimados especiais, como a Mesa da Assembleia Legislativa ou Câmara Legislativa do Distrito Federal, Governadores e Confederações Sindicais ou Entidades de Classe nacionais, enquanto os demais são conhecidos como legitimados universais, tendo em vista que não carecem da necessidade de comprovar a relação entre o objeto e o pedido da ação. Veja-se jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

LEGITIMIDADE – PROCESSO OBJETIVO –

CONFEDERAÇÃO – PERTINÊNCIA TEMÁTICA. As confederações não têm legitimidade universal, devendo haver pertinência temática, ou seja, elo entre o objeto social e a norma atacada. (STF – ADI: 6242 ES 0031853-74.2019.1.00.0000, Relator: MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 22/06/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 01/09/2020)

LEGITIMIDADE – PROCESSO OBJETIVO – ASSOCIAÇÃO – PERTINÊNCIA TEMÁTICA. As associações de classe não têm legitimidade universal, devendo haver pertinência temática, ou seja, elo entre o objeto social e o ato atacado. (ADPF 361 AgR-segundo, Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 06/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-123 DIVULG 20-06-2018 PUBLI 21-06-2018) (STF – AgR-segundo ADPF: 361 DF – DISTRITO FEDERAL 0005341-93.2015.1.00.0000, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 06/06/2018, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-123 21-06-2018)

AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. SUPOSTA OMISSÃO LEGISLATIVA NA IMPLEMENTAÇÃO DE IMPOSTO DE COMPETÊNCIA DA UNIÃO. GOVERNADOR DO ESTADO DO MARANHÃO. ILEGITIMIDADE ATIVA. AUSÊNCIA DE PERTINÊNCIA TEMÁTICA. PRECEDENTES. DESPROVIMENTO DO AGRAVO REGIMENTAL. 1. Alegação de omissão legislativa na implementação de imposto de competência da União – Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF). Ausência de previsão constitucional de repartição de receitas desse tributo com os demais entes federados. 2. A jurisprudência desta CORTE é pacífica no sentido de que a legitimidade para a propositura das ações de controle concentrado de constitucionalidade, em face de ato normativo oriundo de ente federativo diverso, por governadores de Estado, exige a demonstração de pertinência temática, ou seja, a repercussão do ato, considerados os interesses do Estado. Precedentes. Ausência de pertinência temática. 3. Ilegitimidade ativa do Governador do Estado do Maranhão para propor Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão com o objetivo de instituir imposto de competência da União. 4. Agravo Regimental a que se nega provimento. (STF – AgR ADO: 31 DF – DISTRITO FEDERAL 0000282-27-2015.1.00.0000, Relator: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento 09/04/2018, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-072 16-04-2018)

Dessa forma, evidente que o STF trouxe a exigência de interesse de agir específico às ações diretas, bem como apresentou uma interpretação limitada do artigo 103 da Constituição Federal quando demandou a necessidade de demonstração da pertinência temática através da jurisprudência.

Porém, há de se questionar acerca da contrariedade e inconstitucionalidade deste instituto. O controle de constitucionalidade visa garantir a supremacia da Constituição quando confrontada sua compatibilidade com uma lei específica e, tendo caráter objetivo, é totalmente despropositado criar um suposto vínculo de interesse subjetivo específico dos legitimados.

Para além disso, o requisito em questão não se encontra na Constituição Federal, o que torna ilógico requerer sua demonstração em ações que visam justamente a análise de institutos que caminham em desacordo com a Carta Magna.

Em que pese o STF reforce a aplicação da pertinência temática a fim de atenuar o acúmulo de processos, não se mostra coerente delimitar a interpretação constitucional através de meios que visam claramente guardar a Constituição Federal.

Por fim, mostra-se necessária a revisão deste instituto, bem como a análise de outros quesitos e formas de controlar a quantidade de processos que chegam ao nosso Supremo Tribunal Federal.

Por: Ana Caroliny Carvalho

Referências Bibliográficas:

TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 7. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2009.

[1] TAVARES, André Ramos. Curso De Direito Constitucional.7. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2009.

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