Breves considerações sobre as acepções formal e material do instituto da fidelidade partidária:

As acepções formal e material do instituto da fidelidade partidária no Direito Eleitoral brasileiro.

A fidelidade partidária é um complexo instituto de Direito Eleitoral relacionado à filiação a partidos políticos, observância aos normativos partidários e exercício de eventual mandato eletivo.

Quanto à filiação partidária em seu aspecto material, espera-se que aquele que adentrar à agremiação política seja leal aos seus pares e tenha os mesmos ideais que o Partido.

No que tange à observância aos normativos, a expectativa é a de que o filiado observe as diretrizes definidas pelo partido em suas atuações cotidianas. Finalmente, acerca do mandato eletivo, o exercente pode se sujeitar à perda de seu mandato, por exemplo, caso não observe as decisões programáticas do partido sobre votações relacionadas a determinados temas legislativos, especialmente para eleições proporcionais.

No que concerne às eleições proporcionais, o Supremo Tribunal Federal já fixou o entendimento, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.999 e nos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604, que a fidelidade partidária, nas eleições proporcionais, é condição para manutenção e exercício do mandato eletivo.

Vale dizer, não se trata de direito pessoal do candidato, mas sim de instituto direta e intimamente vinculado à agremiação partidária, a fim de que o exercente do mandato eletivo não perca a representatividade que conquistou nas urnas. O mandato, portanto, pertence mais ao partido do que ao candidato.

Um exemplo prático disto é o caso envolvendo o falecimento do então Deputado Federal Clodovil Hernandez (Partido Trabalhista Cristão – PTC), cujo suplente, após o falecimento de Clodovil, pretendeu assumir o mandato, mas havia requerido sua transferência para outra agremiação partidária (PR – Partido da República), razão pela qual o PTC indicou outro candidato para assumir a vaga de Clodovil.

Na ocasião (Mandado de Segurança nº 27.938), a Suprema Corte definiu que, como os eleitores de Clodovil votaram no PTC, e não propriamente no candidato, o suplente só poderia assumir o mandato caso estivesse filiado ao partido, o que não era mais o caso, motivo pelo qual foi considerada regular a conduta partidária de indicar outro suplente como deputado.

Em sentido diverso, para cargos eletivos majoritários, o Pretório Excelso é pacífico no sentido de que o mandato pertence ao candidato, e não à sigla partidária, daí porque inaplicável a perda do cargo eletivo em razão de eventual caracterização de infidelidade partidária.

Outrossim, mesmo para eleições proporcionais, o STF também já sedimentou que a presença de justa causa para a troca partidária (v.g. perseguições, drástica mudança do programa partidário etc.) impede que o político perca seu mandato eletivo por suposta infidelidade ao partido pelo qual foi eleito.

Ademais, por sua vez, o Tribunal Superior Eleitoral definiu que não possui interesse o partido político que recebe político que havia sido eleito por outra legenda ao cargo e, posteriormente, sai desse novo partido e se transfere para outro, a postular a perda do mandato por infidelidade partidária desse político itinerante, notadamente porque, como “segundo” partido do eleito, não possui suplentes para substituir o político em seu mandato.

Finalmente, segundo o TSE, eventual resistência da agremiação partidária à pretensão do filiado concorrer a cargo político ou intenção de viabilizar essa candidatura por outro partido não caracteriza justa causa, nem tampouco a divergência entre filiados ao mesmo partido político, daí porque, caso o filiado pratique atos contrários à fidelidade partidária por essa razão, restará caracterizada sua infidelidade.

Lado outro, no que tange a acepção formal, trata-se da previsão legal (lei em sentido amplo) do conceito de fidelidade partidária e das consequências à infidelidade. Especificamente, a Resolução-TSE nº 22.610, de 25.10.2007, alterada pela Resolução-TSE nº 22.733, de 11.3.2008, é o instrumento normativo que disciplina a perda de mandato eletivo por infidelidade ao partido, bem como prevê hipóteses para justificação de desfiliação partidária ou troca entre agremiações.

A título de ilustração, a agremiação partidária interessada, o Ministério Público Eleitoral e outros interessados podem requerer à Justiça Eleitoral a perda de mandato eletivo motivada por desfiliação partidária levada a efeito sem justa causa.

O §1º do art. 1º da Resolução-TSE nº 22.610/2007 define que a justa causa pode ser (i) a incorporação ou fusão do partido; (ii) a criação de novo partido; (iii) a mudança substancial ou o desvio reiterado do programa partidário; e (iv) a grave discriminação pessoal.

No âmbito federal, compete ao TSE o processamento e julgamento de requerimentos de perda de mandato eletivo por infidelidade partidária. No tocante às demais hipóteses, a competência está a cargo dos Tribunais Regionais Eleitorais.

Há que se ressaltar que o Tribunal Superior Eleitoral já fixou o entendimento de que a perda do mandato político por infidelidade partidária não pode ser objeto de previsão estatutária pela agremiação partidária, devendo tal previsão advir de lei em sentido amplo (Res.-TSE nº 22866/2008).

São estas as principais considerações acerca das acepções material e formal do instituto da fidelidade partidária.

Por: Luís Felipe Pardi, advogado associado em Gonçalves e Bruno Sociedade de Advogados – GBSA, inscrito na OAB/SP sob nº 409.236, graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pós-graduado em Direito Processual Penal pela Escola Paulista da Magistratura.

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